Se você concorda que a solução para o problema das drogas
deve ser com a polícia subindo morros e favelas e atirando em todos que passam
pela frente, matando pessoas indiscriminadamente sem saber quem são, ao invés
de reconhecer que se trata de um problema de saúde pública, e que se algum
parente seu se envolver com qualquer tipo de droga (um cigarrinho de maconha
que seja) deve ser tratado da mesma forma, como bandido, e não tratado como uma
pessoa que talvez tenha uma doença e que talvez precise de ajuda. Se você
concorda que o consumo de droga, mesmo de um cigarro de maconha, deve ser
criminalizado e combatido “à bala”;
Se você considera que a “guerra às drogas”, em curso em
vários países do mundo há décadas – sem qualquer resultado positivo – é a
solução para o problema. Se você acha que entende a dor que deve sentir uma
família que vê um filho se envolver com drogas – principalmente em um país que
vai tratar esse filho como um criminoso e um marginal, e não como um ser humano
que talvez apenas necessite de ajuda;
Se você concorda que a família que deve merecer proteção do
Estado é apenas aquela tradicional, dos séculos passados, constituída
unicamente por um pai, uma mãe e filhos, todos brancos, heteros e cristãos – e
não a família típica do século 21, com mães ou pais solteiras (viúvos,
separados, independentes ou outros) ou com casais do mesmo sexo com filhos, ou
casais sem filhos, ou pessoas casadas que moram em casas separadas, ou casais
separados que ainda compartilham o mesmo lar, ou casais de etnias e raças e
religiosidades diversas, ou qualquer outra dentre tantas possibilidades;
Se você acha que liberdade significa ter posse de uma arma
para poder sair livremente pela rua sem ser molestado por “bandidos” ou
“vagabundos”, e não que liberdade signifique viver em uma sociedade com menos
desigualdades sociais, para que não haja “bandidos” e “vagabundos”, mas sim
cidadãos trabalhadores compartilhando a mesma sociedade. Se você acha que a
polícia - e mesmo você - devem decidir quem é bandido e quem é suspeito e está
ameaçando sua liberdade, e que em razão disto podem atirar e matar esses
“bandidos” que interferem na sua liberdade e na sua paz. Se você acha que
armado você é capaz de resolver o problema da insegurança pública, substituindo
o Poder Judiciário e ainda solucionar o grave problema do sistema prisional;
Se você concorda que a solução para o problema das
desigualdades sociais é apostar no capitalismo para aumentar o fosso que divide
a sociedade entre os bem-sucedidos e os pobres, e ter que se armar para se
defender dos necessitados, criando uma espécie de guerrilha urbana, ao invés de
apoiar um capitalismo social, que busca dividir a renda, para que não exista
essa diferença gritante entre ricos e pobres e você acabe concluindo que não
precisa se armar contra ninguém;
Se você concorda que a mulher deve ser recatada e do lar, e
servir como apoio para que os homens continuem ditando os rumos da sociedade,
se você concorda que o fato de mulheres se vestirem como quiserem e se
manifestarem como quiserem, são sinais de que ela está apenas querendo se
insinuar para os homens. Se você acha normal que mulheres, que historicamente
desempenham muito mais papeis na sociedade do que os homens – e sempre foram
canceladas da história para que fosse mantida, à força, a hegemonia masculina -
recebam salários menores por fazerem exatamente as mesmas atividades e responsabilidades
que os homens. Se você continua achando normal vermos tão poucas mulheres em
posição de destaque nas empresas e nas carreiras públicas, bem como no
Legislativo e no Judiciário;
Se você concorda que pessoas com afetividades diversas da
sua, pessoas que amam pessoas do mesmo sexo, pessoas que não se identificam com
o gênero de nascimento, pessoas que não se identificam com gêneros, pessoas que
se vestem e se portam como gênero diverso do seu, pessoas que vivem sua
sexualidade de uma forma diferente do que você acredita ser a única sexualidade
possível – a sexualidade hetero e dominada sempre pelo homem, senhor da razão –
não merecem respeito social e proteção estatal. Se você se sente incomodado em
ver pessoas com identificação de gênero e sexualidades diferentes da sua
vivendo livres e felizes suas vidas, como elas são;
Se você entende que falar sobre diversidade e respeito nas
escolas vai incitar crianças a se tornarem o que não são – ao invés de tentar
compreender que discutir o tema apenas compartilha com as crianças que a base
de uma sociedade se ampara exatamente no respeito à diversidade, e que o ser
humano é complexo e deve ser entendido e respeitado em sua complexidade, na sua
integridade e na sua plenitude – e não rotulado como pertencente à caixinha
azul ou à caixinha rosa – e que qualquer coisa fora disso vai pra caixinha do
lixo, como marginal;
Se você concorda com a ideia de que não existe racismo no
Brasil, que homens e mulheres brancos e homens e mulheres negros têm as mesmas
oportunidades no mercado de trabalho, se você acha que a sociedade não tem
incrustada em sua formação um racismo estrutural, que nos faz achar normal
pessoas negras trabalharem em funções menos importante e nos faz estranhar ver
ministros, doutores, engenheiros negros. Se você acha que é normal ter medo de
cruzar uma pessoa negra na rua, e não ter o mesmo medo se a pessoa for branca.
Se você concorda que negros, mesmo sendo a maioria da sociedade brasileira, não
devem ter lugar nas escolas, nas universidades. Se você pensa que as políticas
inclusivas, como as cotas, servem apenas para ajudar a colocar pessoas negras
despreparadas em profissões que não chegariam de outra forma, e não entende que
as políticas de cotas servem muito mais para ajudar a sociedade a vencer esse
problema, a permitir diversidade de pensamentos, de sentimentos, de
pertencimento e de visões nas escolas, universidades, instituições;
Se você acredita que a escravização de negros africanos (e
também de indígenas) foi apenas um período da história do Brasil, que ficou lá
para trás, se acha que os negros não carregam esse peso até os dias de hoje (e
se você realmente também não carrega esse peso), se acha que a escravização
acabou com a assinatura da lei áurea e a partir daí nos tornamos um país sem
racismo, e que somos todos irmãos com exatamente as mesmas chances e
oportunidades;
Se você concorda que os povos originários não têm direito a
terra e a espaços para manterem vivas suas culturas e tradições, mas que o
capitalismo deve investir sobre suas áreas para plantarmos cada vez mais, para
explorarmos os minérios e outras riquezas naturais, e se você acha que essas
áreas são disputadas por grupos estrangeiros, e que países desenvolvidos não
estão preocupados em preservar o meio ambiente, querem apenas tomar o Brasil e
levar embora todas as suas riquezas, e colaborar com a destruição do meio
ambiente do Brasil (que eles sabem ser um dos últimos habitats que ajudam a
manter a vida na terra como a conhecemos) e, com isso, acabar de vez com o planeta
– que coincidentemente também é o planeta deles;
Se você concorda que professar o cristianismo ou outra
religião ou forma de espiritualidade é não respeitar o próximo como ele é, é
não respeitar o meio ambiente, é considerar que apenas sua forma de família, de
afetividade, é válida e sacra, e que sua religião é a única representante do
divino na terra;
Se você concorda que investimento em educação e ciência não
são importantes para resolver vários (ou quase todos) esses problemas vividos
pela sociedade, mas que basta colocar militares para dirigir escolas públicas e
ensinar ordem e respeito às crianças.
Se você concorda que para combater a fome basta liberar o
agronegócio para avançar com suas plantações sobre áreas protegidas, florestas,
matas e biomas, ao invés de apostar que esse mesmo agronegócio pode e deve
investir em tecnologia (que, aliás, temos, e muita) e produzir tanto ou tão
mais sem precisar acabar com os recursos naturais. Se você concorda que, porque
países europeus ou da América do Norte erraram ao devastar seu meio ambiente,
há décadas, temos agora o direito de acabar com nossas matas e florestas, e que
ninguém tem que se meter em nossa “soberania”. Se você entende que os biomas e
florestas brasileiras são assunto só do Brasil, e que o país pode fazer o que
bem entender com elas, incluindo destruí-las;
Se você acha que a corrupção aconteceu apenas durante o
governo de um determinado partido (o único que nos anos recentes não tolheu de
forma alguma a atuação do Ministério Público e das polícias federal e civis), e
não que o sistema político brasileiro é corrompível pela forma como é desenhada
nossa democracia representativa (formada basicamente por bancadas de interesse
setoriais) e a proximidade entre empresas, empresários e políticos, e que a
corrupção não esteve presente em todos os governos, incluindo todos os últimos
governos;
E se você acha que “investir” em outros países,
principalmente mais necessitados – na América Latina ou na África – em lugares
nos quais as pessoas necessitam também de um mínimo de estrutura para viver -
repito, investir, colocar dinheiro e depois receber de volta -, é cometer um
crime, e se o fato de em determinados casos não ter recebido o retorno do
investimento, por problemas dos países destinatários – é um crime do Brasil
(lembrando inclusive que o Brasil já recebeu investimentos de outros países e
deixou de pagar várias vezes em sua recente história);
E, por fim, se você concorda que política se faz comprando
votos e apoios de parlamentares, permitindo a liberação de emendas apenas para
os que estiverem ao lado do governo aprovando seus projetos para emplacar
ideias que, de outra forma, não avançariam. E se você concorda que política se
faz acuando a ameaçando outros poderes instituídos da República, xingando e
desmerecendo seus integrantes em público, insuflando o povo contra esta ou
aquela autoridade, tensionando a harmonia necessária entre os poderes para que
o país siga usufruindo de um estado democrático de direito;
Se você concorda com tudo isso, então realmente você não
deve votar no candidato da atual oposição.
Vote tranquilo no candidato da situação. Mas assuma que você não
está votando nesse candidato porque o candidato da oposição é ladrão e você não quer ladrão no governo. Assuma
que você vota assim porque é, também, conservador, concorda e se identifica com essa
pauta conservadora, que não aceita incluir a diversidade na sociedade, que não
quer viver lado a lado, compartilhando espaços e direitos iguais com pessoas
negras, indígenas, mulheres, pessoas LGBT, pessoas menos favorecidas, pessoas marginalizadas, pessoas
que enfrentam problemas de saúde causados pelas drogas, enfim, com qualquer
pessoa que seja um pouco diferente de você. Assuma que para você todos são
iguais, desde que todos sejam iguais a você.