terça-feira, 25 de outubro de 2022

Ainda propondo reflexões para o encontro com as urnas no próximo domingo (30): o aborto!

Inicialmente, cabe frisar que os dois candidatos que disputam o segundo turno das eleições 2022 já se declararam, pessoalmente, como contrários à prática. Isso é fato.

Também é preciso lembrar que não é o presidente da República quem decide se o aborto deve ser legalizado ou não no país. Essa discussão cabe ao Congresso Nacional.

Agora, o mais importante, o crucial: vamos combinar que quem tem que decidir sobre a legalização – ou não – do aborto são as mulheres. Ponto.

Quem são os homens para dizer o que a mulher deve fazer com a sua vida e com o seu corpo. Chega desse machismo dominante, prepotente, tentacular e tóxico.  

Aborto envolve a vida delas. É isso. Porque, no final das contas, muitas das mulheres que tentam fazer um aborto, se não o fizerem, vão acabar cuidando sozinhas dos filhos que vão nascer. Porque, no final das contas, nessas situações, não há um pai, um parceiro, um marido. É uma decisão que envolve o passado da mulher e tudo que ela já viveu e suportou; o presente da mulher, a situação que ela esta vivendo naquele momento (muitas vezes sozinha); e  o seu futuro e da própria criança. Então quem são os homens para decidir o que as mulheres devem fazer, como devem encarar a situação? 

E chega dessa ideia, também machista, de que quem faz aborto são mulheres (principalmente jovens) riquinhas que fazem sexo livremente e, depois, se engravidam, vão lá e abortam. Jovens irresponsáveis e sem coração. Não se trata disso. Mulheres que buscam (e fazem!) o aborto são, em sua grande maioria, mulheres e jovens (e mesmo crianças) violentadas, enganadas, ignorantes, pobres, que vivem problemas com drogas, marginalizadas e abandonadas pela sociedade. Há ainda casos que envolvem a saúde e mesmo a sobrevivência de mãe e filho e outras situações pontuais e específicas.

Mas – e isso é muito importante - não vamos nos esquecer que, legalizando ou não, os abortos acontecem no Brasil, e aos milhares. Trata-se de uma questão de saúde pública, que precisa, sim, ser debatida. É preciso, sim, encarar o problema e criar uma alternativa consensual e que possa ser implementada, respeitada e fiscalizada.

Então, se você é homem, coloque-se no seu lugar, respeite o pensamento e o posicionamento das mulheres sobre o tema. Cabe só a elas decidir.

Se você é mulher, se posicione, discuta. Se você é contra por questão religiosa, biológica, científica, cultural ou qualquer outra motivação, argumente, defenda seu posicionamento. Se você é favor, da mesma forma, coloque suas ideias no debate. Se é possível um meio termo, que seja debatido, regulamentado, definido.

É dessa discussão que deve sair a proposta sobre o tema para o país, a ser encaminhada ao Congresso Nacional, instância competente para disciplinar a matéria.

Então, por favor, não vamos deixar essa discussão influenciar no debate. Até porque, como dito no início, os candidatos postos já se declararam pessoalmente contrários à prática. Não há porque ficar jogando ao vento que tal candidato é contra ou favor, que tal candidato vai fazer do aborto uma política pública ou que tal candidato vai proibir a prática por conta própria.

O tema é sério. Merece ser tratado com seriedade e com respeito. No momento e na instância certas.

PS: então a ideia é que o homem não tem voz nessa discussão? Tem, se ele estiver ao lado da mulher, assumindo seu papel e, principalmente, se ela quiser ouvi-lo. De novo, o tema é sobre elas. Então, a batuta está com elas. 

segunda-feira, 24 de outubro de 2022

Para refletir antes de ficar frente à frente com a urna eletrônica, neste próximo domingo (30), 2º turno das eleições no Brasil

Se você concorda que a solução para o problema das drogas deve ser com a polícia subindo morros e favelas e atirando em todos que passam pela frente, matando pessoas indiscriminadamente sem saber quem são, ao invés de reconhecer que se trata de um problema de saúde pública, e que se algum parente seu se envolver com qualquer tipo de droga (um cigarrinho de maconha que seja) deve ser tratado da mesma forma, como bandido, e não tratado como uma pessoa que talvez tenha uma doença e que talvez precise de ajuda. Se você concorda que o consumo de droga, mesmo de um cigarro de maconha, deve ser criminalizado e combatido “à bala”;

Se você considera que a “guerra às drogas”, em curso em vários países do mundo há décadas – sem qualquer resultado positivo – é a solução para o problema. Se você acha que entende a dor que deve sentir uma família que vê um filho se envolver com drogas – principalmente em um país que vai tratar esse filho como um criminoso e um marginal, e não como um ser humano que talvez apenas necessite de ajuda; 

Se você concorda que a família que deve merecer proteção do Estado é apenas aquela tradicional, dos séculos passados, constituída unicamente por um pai, uma mãe e filhos, todos brancos, heteros e cristãos – e não a família típica do século 21, com mães ou pais solteiras (viúvos, separados, independentes ou outros) ou com casais do mesmo sexo com filhos, ou casais sem filhos, ou pessoas casadas que moram em casas separadas, ou casais separados que ainda compartilham o mesmo lar, ou casais de etnias e raças e religiosidades diversas, ou qualquer outra dentre tantas possibilidades;

Se você acha que liberdade significa ter posse de uma arma para poder sair livremente pela rua sem ser molestado por “bandidos” ou “vagabundos”, e não que liberdade signifique viver em uma sociedade com menos desigualdades sociais, para que não haja “bandidos” e “vagabundos”, mas sim cidadãos trabalhadores compartilhando a mesma sociedade. Se você acha que a polícia - e mesmo você - devem decidir quem é bandido e quem é suspeito e está ameaçando sua liberdade, e que em razão disto podem atirar e matar esses “bandidos” que interferem na sua liberdade e na sua paz. Se você acha que armado você é capaz de resolver o problema da insegurança pública, substituindo o Poder Judiciário e ainda solucionar o grave problema do sistema prisional;

Se você concorda que a solução para o problema das desigualdades sociais é apostar no capitalismo para aumentar o fosso que divide a sociedade entre os bem-sucedidos e os pobres, e ter que se armar para se defender dos necessitados, criando uma espécie de guerrilha urbana, ao invés de apoiar um capitalismo social, que busca dividir a renda, para que não exista essa diferença gritante entre ricos e pobres e você acabe concluindo que não precisa se armar contra ninguém;

Se você concorda que a mulher deve ser recatada e do lar, e servir como apoio para que os homens continuem ditando os rumos da sociedade, se você concorda que o fato de mulheres se vestirem como quiserem e se manifestarem como quiserem, são sinais de que ela está apenas querendo se insinuar para os homens. Se você acha normal que mulheres, que historicamente desempenham muito mais papeis na sociedade do que os homens – e sempre foram canceladas da história para que fosse mantida, à força, a hegemonia masculina - recebam salários menores por fazerem exatamente as mesmas atividades e responsabilidades que os homens. Se você continua achando normal vermos tão poucas mulheres em posição de destaque nas empresas e nas carreiras públicas, bem como no Legislativo e no Judiciário;

Se você concorda que pessoas com afetividades diversas da sua, pessoas que amam pessoas do mesmo sexo, pessoas que não se identificam com o gênero de nascimento, pessoas que não se identificam com gêneros, pessoas que se vestem e se portam como gênero diverso do seu, pessoas que vivem sua sexualidade de uma forma diferente do que você acredita ser a única sexualidade possível – a sexualidade hetero e dominada sempre pelo homem, senhor da razão – não merecem respeito social e proteção estatal. Se você se sente incomodado em ver pessoas com identificação de gênero e sexualidades diferentes da sua vivendo livres e felizes suas vidas, como elas são;

Se você entende que falar sobre diversidade e respeito nas escolas vai incitar crianças a se tornarem o que não são – ao invés de tentar compreender que discutir o tema apenas compartilha com as crianças que a base de uma sociedade se ampara exatamente no respeito à diversidade, e que o ser humano é complexo e deve ser entendido e respeitado em sua complexidade, na sua integridade e na sua plenitude – e não rotulado como pertencente à caixinha azul ou à caixinha rosa – e que qualquer coisa fora disso vai pra caixinha do lixo, como marginal;   

Se você concorda com a ideia de que não existe racismo no Brasil, que homens e mulheres brancos e homens e mulheres negros têm as mesmas oportunidades no mercado de trabalho, se você acha que a sociedade não tem incrustada em sua formação um racismo estrutural, que nos faz achar normal pessoas negras trabalharem em funções menos importante e nos faz estranhar ver ministros, doutores, engenheiros negros. Se você acha que é normal ter medo de cruzar uma pessoa negra na rua, e não ter o mesmo medo se a pessoa for branca. Se você concorda que negros, mesmo sendo a maioria da sociedade brasileira, não devem ter lugar nas escolas, nas universidades. Se você pensa que as políticas inclusivas, como as cotas, servem apenas para ajudar a colocar pessoas negras despreparadas em profissões que não chegariam de outra forma, e não entende que as políticas de cotas servem muito mais para ajudar a sociedade a vencer esse problema, a permitir diversidade de pensamentos, de sentimentos, de pertencimento e de visões nas escolas, universidades, instituições;

Se você acredita que a escravização de negros africanos (e também de indígenas) foi apenas um período da história do Brasil, que ficou lá para trás, se acha que os negros não carregam esse peso até os dias de hoje (e se você realmente também não carrega esse peso), se acha que a escravização acabou com a assinatura da lei áurea e a partir daí nos tornamos um país sem racismo, e que somos todos irmãos com exatamente as mesmas chances e oportunidades;

Se você concorda que os povos originários não têm direito a terra e a espaços para manterem vivas suas culturas e tradições, mas que o capitalismo deve investir sobre suas áreas para plantarmos cada vez mais, para explorarmos os minérios e outras riquezas naturais, e se você acha que essas áreas são disputadas por grupos estrangeiros, e que países desenvolvidos não estão preocupados em preservar o meio ambiente, querem apenas tomar o Brasil e levar embora todas as suas riquezas, e colaborar com a destruição do meio ambiente do Brasil (que eles sabem ser um dos últimos habitats que ajudam a manter a vida na terra como a conhecemos) e, com isso, acabar de vez com o planeta – que coincidentemente também é o planeta deles;

Se você concorda que professar o cristianismo ou outra religião ou forma de espiritualidade é não respeitar o próximo como ele é, é não respeitar o meio ambiente, é considerar que apenas sua forma de família, de afetividade, é válida e sacra, e que sua religião é a única representante do divino na terra;

Se você concorda que investimento em educação e ciência não são importantes para resolver vários (ou quase todos) esses problemas vividos pela sociedade, mas que basta colocar militares para dirigir escolas públicas e ensinar ordem e respeito às crianças. 

Se você concorda que para combater a fome basta liberar o agronegócio para avançar com suas plantações sobre áreas protegidas, florestas, matas e biomas, ao invés de apostar que esse mesmo agronegócio pode e deve investir em tecnologia (que, aliás, temos, e muita) e produzir tanto ou tão mais sem precisar acabar com os recursos naturais. Se você concorda que, porque países europeus ou da América do Norte erraram ao devastar seu meio ambiente, há décadas, temos agora o direito de acabar com nossas matas e florestas, e que ninguém tem que se meter em nossa “soberania”. Se você entende que os biomas e florestas brasileiras são assunto só do Brasil, e que o país pode fazer o que bem entender com elas, incluindo destruí-las; 

Se você acha que a corrupção aconteceu apenas durante o governo de um determinado partido (o único que nos anos recentes não tolheu de forma alguma a atuação do Ministério Público e das polícias federal e civis), e não que o sistema político brasileiro é corrompível pela forma como é desenhada nossa democracia representativa (formada basicamente por bancadas de interesse setoriais) e a proximidade entre empresas, empresários e políticos, e que a corrupção não esteve presente em todos os governos, incluindo todos os últimos governos;

E se você acha que “investir” em outros países, principalmente mais necessitados – na América Latina ou na África – em lugares nos quais as pessoas necessitam também de um mínimo de estrutura para viver - repito, investir, colocar dinheiro e depois receber de volta -, é cometer um crime, e se o fato de em determinados casos não ter recebido o retorno do investimento, por problemas dos países destinatários – é um crime do Brasil (lembrando inclusive que o Brasil já recebeu investimentos de outros países e deixou de pagar várias vezes em sua recente história);

E, por fim, se você concorda que política se faz comprando votos e apoios de parlamentares, permitindo a liberação de emendas apenas para os que estiverem ao lado do governo aprovando seus projetos para emplacar ideias que, de outra forma, não avançariam. E se você concorda que política se faz acuando a ameaçando outros poderes instituídos da República, xingando e desmerecendo seus integrantes em público, insuflando o povo contra esta ou aquela autoridade, tensionando a harmonia necessária entre os poderes para que o país siga usufruindo de um estado democrático de direito;

Se você concorda com tudo isso, então realmente você não deve votar no candidato da atual oposição.

Vote tranquilo no candidato da situação. Mas assuma que você não está votando nesse candidato porque o candidato da oposição é ladrão e você não quer ladrão no governo. Assuma que você vota assim porque é, também, conservador, concorda e se identifica com essa pauta conservadora, que não aceita incluir a diversidade na sociedade, que não quer viver lado a lado, compartilhando espaços e direitos iguais com pessoas negras, indígenas, mulheres, pessoas LGBT, pessoas menos favorecidas, pessoas marginalizadas, pessoas que enfrentam problemas de saúde causados pelas drogas, enfim, com qualquer pessoa que seja um pouco diferente de você. Assuma que para você todos são iguais, desde que todos sejam iguais a você.