JK fotografado pelo grande Gervásio Batista |
O problema, no Brasil, tem duas causas principais, ambas extremamente difíceis de serem solucionadas. Nossa imobilidade tem uma causa estrutural – fundada na escolha de governos passados por uma política rodoviarista; e uma causa cultural – uma vez que os brasileiros incorporaram o rodoviarismo historicamente disseminado e não aceitam facilmente mudar para alternativas de transporte que não sejam cômodas como seu carro particular.
A história vem de longe. A chegada dos primeiros automóveis, no início do século XX, enfeitiçou o presidente Washington Luís, que nos idos de 1920 passou a investir pesado na construção de rodovias. Seu projeto era desenvolver uma política rodoviarista no Brasil, o que parecia ser, então, a alternativa certa para o crescimento do país.
Nas grandes cidades, que surgiram sem qualquer planejamento, a malha viária que começava a ser implantada não tinha qualquer preocupação com eventual aumento de frota. Ruelas eram construídas com o único intuito de suportar o insipiente trânsito da época.
Mais adiante, Getúlio Vargas, com sua política também fortemente desenvolvimentista, deu os primeiros passos rumo à industrialização que seria implantada, para valer, no governo do presidente bossa nova Juscelino Kubitschek. O mineiro, desenvolvimentista até o último fio de cabelo, tinha como lema “50 anos em 5”, querendo dizer que faria o Brasil avançar 50 anos durante os cinco anos de seu mandato.
E Juscelino fez muito. Primeiro, trouxe as indústrias de automóvel, que se instalaram inicialmente na região do ABC paulista e começaram a despejar automóveis a preços mais acessíveis no mercado. Foi a partir de então que o brasileiro passou a se locomover em cima de quatro rodas. Depois, investiu mais pesadamente na construção de rodovias e apoiou fortemente a ampliação das malhas viárias urbanas.
Brasília, obra mais marcante de seu governo, é prova disso. Amplas avenidas feitas desenhadas para o trânsito de automóveis. E rodovias foram construídas – saindo ou passando por Brasília – para integrar o país.
O desenvolvimentismo de Juscelino deixou - além de dívidas gigantescas e rombos nos cofres públicos que pagamos até hoje –, dois grandes legados: Brasília, capital cartão-postal, e a “cultura do carro”.
Depois de JK, o automóvel passou a ser uma necessidade básica e um símbolo de status.
Urbanização
A industrialização trouxe como consequência a urbanização do Brasil. O país, predominantemente rural durante a primeira metade do século, foi se transformando em país urbano a partir dos anos 1950. As cidades começaram a inchar – aquelas mesmas cidades que no início do século XX construíram ruelas para o trânsito dos primeiros e pouquíssimos automóveis que circulavam. Essas ruelas, é óbvio, não suportaram o crescimento da frota. Mas não havia como reconstruir as cidades. A solução encontrada, então, foi partir para a construção de viadutos, túneis, elevados, pontes.
Esse, inclusive, continua sendo o caminho escolhido pelos governantes da atualidade, que preferem alargar e duplicar pistas, construir mais e mais viadutos e pontes, ao invés de mudarem o rumo das coisas e investirem em formas alternativas de locomoção, diante da iminência do colapso do atual sistema.
Coadjuvante
Durante todo esse tempo, o transporte coletivo se desenvolveu numa condição de coadjuvante no cenário do trânsito brasileiro. Nunca no papel principal. Seguimos mais o padrão norte americano de transporte, que prioriza o automóvel – o chamado american way of life previa que cada norte americano devia ter uma casa e um carro estacionado na garagem. E menos o padrão europeu, que há muito percebeu que a solução está no transporte coletivo de qualidade – trens e ônibus –, e em formas alternativas de locomoção, como a bicicleta.
Hoje, colhemos os amargos frutos das escolhas feitas há mais de 100 anos pelos governantes da época. Mas também, e principalmente, da insistência insana e inexplicável nos nossos atuais administradores públicos que, talvez reféns dos grandes grupos econômicos (principalmente montadoras e construtoras), não querem mudar o rumo da história, mantendo viva a “cultura do carro”, popularizada pelo presidente bossa nova.
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